Se eu tirasse o “Crônica” e as coisas tivessem corrido melhor o título do texto ia virar filme no SBT.
Há alguns meses tive a brilhante idéia de tirar visto pros States. Pra quando aparecesse oportunidade e tals. Resolvi agendar a entrevista no Consulado do Rio, nem lembro mais o porquê. Preenchi um formulário colossal (e sim, tive que marcar YES quando me perguntaram se eu tinha conhecimento sobre produtos químicos e explosivos...), paguei uns 250 conto e por aí vai.
O tempo passou e eu nem vi. Já tava quase chegando a data da entrevista. “Vou de ônibus”, pensei, “Vai que se eu pegar avião ele atrasa”. E lá fui eu, comprar passagem pra um ônibus que saía quinta às 23:30. Até parece que eu não me conhecia. Óbvio que eu não ia conseguir dormir na viagem. Pra volta, a passagem aérea já estava comprada.
Providenciei mil e um documentos e lá vou eu pra rodoviária. Quem nunca esteve numa rodoviária a essa hora tem que visitar uma. Pessoas de todos os exemplares espalhadas pelas cadeiras desconfortáveis. Umas, sem conseguir conter a empolgação com a expectativa da viagem. Outras, com os olhos retratando uma exaustão quase palpável. No meu caso, não era um nem outro. Era só vontade de acabar tudo isso depressa. O pior de tudo é que no consulado não pode entrar com coisas eletrônicas, então meu bom iPod teve que ficar em casa.
O ônibus até que causou boa impressão. Era daqueles de dois andares. Meu lugar, olha só, era na primeira fileira do andar de cima. E lá fui eu, sacolejando por aí, com vista privilegiada da rota noturna. “Sacolejando” é uma palavra perfeita para o que aconteceu a noite toda. Era só eu tentar dormir que o motorista, temerário, me acordava na primeira curva. Fui pensando na vida, que mais eu podia fazer? Metade da viagem se passou e eu não havia pregado os olhos ainda. “O dia amanhã vai ser aquela beleza”, pensei. Talvez vocês vejam vários “pensei” ao longo do texto. Que mais fazer em uma viagem solitária?
Devo ter cochilado por umas duas horas, em pequenos turnos nas 3 horas e meia restantes de viagem. Cheguei na rodoviária do Rio, umas 6 e pouco da manhã. Muito foda! Nos cinco minutos que fiquei lá deu pra perceber que tinha muita cara de aeroporto. Lojas e mais lojas, até bem arrumadinhas. Precisava ir pro aeroporto Santos Dumont. De lá eu fazia o resto do trajeto até o consulado à pé. E lá vou eu em busca do ônibus de conexão. Fui esperando que fosse igual à BH: você compra a passagem em um guichê na rodoviária e ele sai lá de dentro mesmo.
Ledo engano! Depois de pedir umas informações aqui e ali, descobri que tinha que pegar ônibus na rua mesmo. E qualquer vestígio de ordem acabava quando se saía da rodoviária. Alguns viadutos se cruzavam sobre minha cabeça, enquanto ônibus e mais ônibus (numa taxa de uns 3 por segundo) estacionavam pra pegar passageiros. Tinha até um cara pra organizar o trânsito.
Depois de uns vinte minutos eu peguei um ônibus, um Frescão, com ar condicionado. Andei um pouco e depois saltei em frente ao aeroporto. Na passarela pra cruzar a avenida, uma surpresa: olhei pro lado e vi o Cristo Redentor, bem ao longe. Uma bela visão.
O aeroporto era pequeno. Tomei café e sentei em um canto pra estudar um pouco, até dar a hora de ir pro consulado. E então eu fui. O caminho era até bem agradável. A fila era até gigantesca. Mas, seja lá como for, fui atendido na hora marcada.
O mais incrível de tudo é que ficava um povo recolhendo mochilas, celulares etc das pessoas que iam entrar no consulado, por uns 5 reais ou coisa assim e, mesmo no centrão do Rio, tudo voltava pras suas mãos depois da entrevista.
Saí do consulado a fim de dar uma volta. E fui, andando à esmo pelos arredores, apreciando aquela mistura de construções antigas e prédios modernos. Olho pro lado e opa! Estou em frente à Academia Brasileira de Letras. Um prédio muito bonito, com aquela beleza classuda que se espera. Pena que estava fechado pra visitação.
Andei o resto do quarteirão e, quando estava a fim de arrumar um canto legal pra sentar e pensar na vida, vi o que parecia ser uma exposição de arte, no segundo andar de um prédio bonitão. Entrei e não me arrependi. Era uma mostra de retratos pintados pela artista plástico cubano Julio Piroh. Pois é, eu também nunca tinha ouvida falar, mas as pinturas eram bem legais. Na saída, conversando um pouco com a recepcionista da exposição, descobri que no prédio ao lado funcionava a Biblioteca Rodolfo Garcia, da ABL. Fui pra lá. Era um bom lugar pra sentar, descansar e estudar um pouco.
Precisei fazer carteirinha lá. Nunca vi tanta burocracia. Depois de ler mil avisos e assinar centenas de papéis, fui ler um pouco. Vez ou outra eu parava e olhava em volta. Era tudo muito organizado e bonito. Pena que uma hora depois minha barriga estava roncando alto demais e já perigava de eu ser expulso de lá por perturbar o silêncio. Resolvi almoçar num restaurante pequeno a algumas quadras dali. Não parecia ser muito caro. Mas era. Não sei se pros padrões do Rio, ou ao menos do bairro. Mas 27 conto o quilo de comida é um preço com o qual não estou muito habituado.
Saí do restaurante e andei um pouco mais. Vi do outro lado da avenida umas placas com o símbolo da Petrobrás, perto de um prédio bem diferente, mas bonito. Atravessei a passarela e descobri que o prédio diferente era o Museus de Arte Moderna. Andei mais um pouco e vi o mar. Era uma enseada bem bonita, repleta de barcos e rodeada de pequenos montes. Descobri depois que era a Marina da Glória. Sentei de frente pro mar e fiquei apreciando o horizonte. Percebi que dali onde estava eu podia ver, ao longe, o bondinho do Pão de Açúcar e o Cristo Redentor. E fiquei ali olhando em volta, até que resolvi ler um pouco. Li o que consegui – era difícil impedir que o vento passasse as páginas. Levantei pra ir pro aeroporto. Já estava chegando a hora de fazer o check-in. Vi que um cara sentado perto de mim me olhava e rabiscava algo. Saí andando, os olhos dele me acompanharam e os rabiscos prosseguiram. Na hora não tive a idéia de pedir pra ver o desenho. Hoje eu me arrependo.
Na volta pro aeroporto, uma nova olhada pro Cristo na passarela.
O vôo não atrasou, mas peguei um baita trânsito em BH. Foi um jeito diferente de conhecer um pedacinho de nada no Rio. E foi bem legal.
E não, não consegui o visto. Mas isso nem importa mais.
Eu tava ali embaixo!!
2 comentários:
Bonito
Essa é a famosa crônica do jeca na cidade grande.
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